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terça-feira, 24 de agosto de 2010

Inspiração do Japão





Por ser uma pessoa racional, comedida, que não "se joga" sem medir as consequências, que não fala sem pensar, que não executa sem planejar (nossa, gente, como sou chata, né?), não raro pessoas que seguem seus instintos, sua intuição, despertam minha admiração. Sim, porque não é por não ser impulsiva que não admiro pessoas assim. Hoje de manhã fui a uma palestra com Kenzo Takada, o estilista japonês que revolucionou a moda ao trazer elementos do oriente para o ocidente e mostrar que a moda pode, sim, compreender peças confortáveis e amplas sem perder o charme. Ele - com suas estampas de prados e flores - foi uma das "caras" dos anos 1970 e isso se deve a um único fato: ele confiou em seu talento e foi fundo quando tudo parecia perdido. Olha só o que Kenzo contou na palestra hoje:
"Nos anos 1960 ainda não havia chegado ao Japão o conceito de prêt-à-porter, era tudo muito novo. Uma das minhas principais referências no começo era a alta costura de Yves Saint Laurent. Já no segundo ano da faculdade, em 1965, eu consegui um emprego como designer de moda em uma loja no refinado bairro de Ginza. Com esse emprego comprei um belo apartamento, que acabei vendendo, pegando o dinheiro e indo para Paris, em 1965 mesmo. Mas preferi ir de navio, ao invés de avião, em uma viagem que durou 30 dias. Passei por Hong Kong, Cingapura, Índia, Djibuti, Alexandria e cheguei a Marselha no dia 31 de dezembro. Essa viagem foi muito marcante na minha vida. As roupas e a cultura que vi nesses lugares, o clima, as experiências que vivi, tudo teve grande impacto nas minhas criações.
Quando cheguei na França e precisei pegar um trem para Paris foi que me dei conta que não sabia falar uma palavra em francês. E minha primeira impressão de Paris foi chocante: esperava uma bela estação de trem, iluminada por lustres chandelier, e me deparei com um lugar sombrio e frio. Foi um choque e na hora pensei em retornar para o Japão. Com o tempo, é claro, aprendi o idioma, fiz amigos e tudo foi ficando mais fácil.
Mesmo assim, eu tinha ido com o plano de ficar lá por seis meses e quando o prazo estava chegando ao fim, estava louco para ficar, mas meu dinheiro já tinha acabado. Liguei para minha mãe, pedindo para que ela me mandasse mais, mas ela se recusou. Então assumi um último risco: desenhei uns croquis durante uma semana. Bati na porta de Louis Férraud (um estilista de Alta Costura) e a mulher dele comprou cinco desses croquis, por US$5 cada. Mesmo tendo valido tão pouco, isso me animou. Fui direto até a redação da revista Elle e lá encontrei Jacques, que gostou do meu trabalho e me recomendou para lojas de departamento e de prêt-à-porter. Consegui, então, emprego em uma butique de prêt-à-porter. Com o tempo, vários amigos do Japão foram abrindo suas butiques em Paris e me estimularam a fazê-lo. Alguns amigos e a dona de uma galeria me ajudaram a abrir minha loja (a Jungle Jap, inaugurada em 1970), que eu mesmo reformei".
Nessa altura da história eu já admirava esse homem que do alto de seus 70 anos nem pensa em parar de criar. Foi quando ele contou um detalhe que chamou ainda mais minha atenção: adivinha qual obra de arte ele escolheu para decorar a boutique e reproduziu fielmente? (Sim, porque ele também é um artista, alguém tinha alguma dúvida?). O quadro - abaixo - chamado O Sonho, do artista Henri Rousseau. Nada mais propício, não acham? Como é bom sonhar, e se inspirar...

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